ILUSÃO
Sinto que a noite vai ser longa
O pesadelo parece não ter fim
Ouço a chuva a cair
E sinto
Que parte um pedaço de mim
Chega a madrugada
E com ela
A triste solidão
De nada serve o lamento
Pois nada vai terminar este tormento
Chega a manhã
E com ela o sol de inverno
E eu espero por ti
Espero pelo teu amor eterno
Mas tu não regressas mais
TUDO OU NADA
O dia amanheceu cinzento
Estava frio e fazia vento
Partiste sem nada dizer
Junto daquela janela
Onde tudo se podia ver
E quando te afastaste
O meu peito tornava-se cinzento
Tal qual o dia que tinha amanhecido
Por uns instantes choveu
Não na rua
Mas sim nos meus olhos
Que deixaram de te ver
Na janela uma flor
As minhas lágrimas secou
O dia terminou
E tu não regressaste
A flor
Essa bela flor
Também secou
E no meu peito a dor continuou
Porque tu não regressaste
NOITE
Mais uma noite
Mais umas horas de solidão
E lá está
Sentado na velha cadeira
Aquele a quem chamam poeta
Um ser igual a tantos outros
Que escreve á sua maneira
E é nessas malditas noites
Na mais profunda solidão
Que aquele a quem chamam poeta
Se enche de inspiração
Por vezes chora a escrever
Outras escreve a sorrir
Sentado na sua cadeira
Escreve o que está a sentir
É BOM RECORDAR
Há que saudades
Do tempo em que fui criança
Quando vivia no campo
Tinha sol em abundância
E os dias eram um espanto
Á noite tudo era escuro
Não olhava a distâncias
E respirava ar puro
Como era bom recordar
Junto da minha janela
Ouvindo os pássaros cantar
E depois de levantar
O almoço ia cheirar
Dentro da velha panela
Brincava eu todo o dia
Sempre até ao sol-pôr
Ali havia alegria
Ali existia amor
Sempre muito contente
Com os livros na sacola
Dava bom dia a toda a gente
No caminho para a escola
No bolso levava a fisga
Debaixo do braço a bola
Naquela pequena aldeia
Não existiam vaidades
Bem podem ter a ideia
Como eu sinto saudades
FOLHA DE PAPEL
Só tu não me deixaste
Comigo não foste cruel
Sempre boa companheira
Linda folha de papel
Nas minhas horas mais tristes
Companheira noite e dia
Comigo tudo sentiste
Folha de papel alegria
Um dia tudo acabou
Não sei o que aconteceu
Na caneta não pegou
E a folha de papel ardeu
A ESTRADA DA VIDA
É longa a estrada da vida
Difícil de caminhar
É traiçoeira como todas as estradas
Tem passeios muito estreitos
E curvas muito apertadas
É feita de algodão
As faixas são de cetim
Se não estivermos atentos
Aos perigos de momento
Pode ser o nosso fim
Também tem alguns rochedos
Tal e qual outros caminhos
Em vez de algodão há medos
E o cetim feito de espinhos
Tentamos chegar mais longe
Paramos logo em seguida
Como é difícil caminhar
Na dura estrada da vida
ERA EU
Lembro-me de uma aldeia
Bem no meio do Alentejo
Rodeada de alegria
Terra que á muito não vejo
Lembro-me de uma criança
Que ali brincava com esperança
De um dia ser alguém
Cedo da aldeia saiu
Felicidade conseguiu
E os sonhos
Esses mantém
Cedo deixou de estudar
Começando a trabalhar
Para ser alguém na vida
Sonha um dia ser escritor
Apenas pelo amor
Que sente pela sua escrita
Hoje dizem ser poeta
Foi o que a vida lhe deu
Riqueza diz não querer
Apenas feliz quer ser
Essa criança era eu
LIÇÃO DE VIDA
Foi já na estrada da vida
Que aprendi a caminhar
Feita de rosas e espinhos
Mas sempre, sempre a sonhar
Há muitos anos atrás
Que o pesadelo findou
Foram tantas horas más
Quase a vida me levou
Só serve para recordar
O tempo que já passou
Com deus a acompanhar
O homem que sempre sonhou
Hoje sinto-me feliz
Sei que voltei a ser eu
Escrevo para recordar
A lição que a vida me deu
ONDE NASCI
Não nasci em berço de ouro
Nem em cama de palhinhas
Talvez seja um tesouro
Guardado a sete chavinhas
Tesouro tão bem guardado
Que nunca ninguém desvendou
Só minha mãe saberá
Onde nasci e quem sou
Se um dia alguém pensar
Em desvendar o tesouro
Minha mãe ela terá
Uma resposta concreta
E decerto vão saber
Onde nasceu e quem é
Paulo silva
A quem chamam de poeta